segunda-feira, maio 16, 2005

Aborto????? Não obrigado, basta sermos democratas.


Foto posta por AVP

"Nunca se deve esquecer que há pessoas sérias e bem-intencionadas favoráveis à legalização do aborto. Isto deve ser recordado porque essa campanha está a ser conduzida de forma tão infame, tão vergonhosa, tão canalha, que é fácil ignorá-lo.Há oito anos, a 20 de Fevereiro de 1997, a lei de liberalização da prática do aborto foi pela primeira vez votada em Portugal, e recusada no Parlamento, por 112 votos contra, 111 a favor e três abstenções. Perante este resultado inesperado, o Partido Socialista manifestou a sua "elevação" democrática, substituindo os deputados a quem dera liberdade de voto e, na mesma legislatura, reapreciando a mesma lei, agora obedientemente aprovada por 116 votos, contra 107 e três abstenções.Essa infâmia democrática foi tão evidente que, honra seja feita aos parlamentares, a Assembleia acabou por decidir convocar um referendo para legitimar uma decisão que ela própria tinha manchado. O que aconteceu depois foi a mais extraordinária manifestação de maturidade democrática do Portugal moderno. Grupos de cidadãos anónimos, com meios improvisados e sem qualquer apoio partidário, enfrentaram as poderosíssimas forças da esquerda maciçamente mobilizadas. E ganharam. O referendo de 28 de Junho de 1998 confirmou a decisão original da Assembleia, com 50,9% contra a lei, 49,1% a favor e 68% de abstenção.Este facto, mais surpreendente que o primeiro, justificaria evidentemente uma forte reflexão política e uma decidida revisão de métodos e posições. Mas o fundamento das forças chamadas "populares" é julgarem-se iluminadas pela verdade indiscutível. O povo só tem razão quando concorda com elas.Assim, assistimos desde então, com particular vigor hoje, à ânsia descontrolada em impor uma lei que por duas vezes foi já democraticamente rejeitada. Quando o Governo diz que quer resolver a questão por referendo, significa que haverá tantos referendos até que a sua opinião ganhe. E ameaça já impô-la na Assembleia, se o povo se atrever a não concordar com ele.Todas estas práticas, que noutras circunstâncias levantariam urros de indignação política, neste tema pareceram justificadas. A razão é que os que lutam pela legalização do aborto estão convencidos de que defendem a mais elevada justiça perante forças obscurantistas e retrógradas. No entanto, são eles quem obscurece o problema, ocultando dois elementos centrais da questão a vida do bebé, evidentemente envolvida, e o tremendo drama futuro do remorso da mãe que abortou. O problema é tudo menos evidente.Porquê então esta fúria fanática num ponto tão controverso? Será que o País não tem problemas muito mais graves e urgentes? Todos sabemos tristemente que sim! Será por causa dos números astronómicos de abortos clandestinos? Claro que não! Eles sabem, melhor que ninguém, que esses números não têm base séria e foram inventados na lógica de que uma mentira muito repetida fica verdade. Serão os julgamentos de mulheres? Isso ainda menos. Todos se lembram que antes desta campanha não havia em Portugal processos desses. Eles apareceram nos últimos anos e são sempre oportunidades para grandes manifestações abortistas. É pelo menos de desconfiar da origem de tal afã judicial.Este aspecto, aliás, aponta para um outro elemento importante. Enquanto as forças opostas à banalização do aborto se preocupam genuinamente com as pessoas envolvidas, criando dezenas de instituições para apoio às famílias e crianças, do lado contrário a questão é meramente legal. A vitória é política e os casos reais são apenas usados como arma de arremesso. Hoje esses dramas são simples argumentos para debate, e na eventualidade de um dia ser aprovada a lei, o desinteresse por eles será total, como era antes de terem apostado estrategicamente no tema.Estes episódios levam a suspeitar que o que está afinal em causa é, não o aborto, mas sobretudo a honra ferida da esquerda, a infantil fome de desforra. Por isso é fácil esquecer que também lá há pessoas sérias e bem-intencionadas."

in DN by João César das Neves


Palavras para quê? Não é que o homem até tem toda a razão do mundo....

7 Comments:

Blogger Gia said...

E não é que este César das Neves não disse uma frase que se aproveite?
É claro que a questão é polémica e assenta em premissas onde não é possível "convencer" o adversário a mudar de posição. Ou se é a favor da despenalização do aborto, ou não se é a favor.
O que difere é normalmente a razão ou razões pelas quais se é a favor ou contra.
Eu tenho muitas razões para ser a favor da despenalização, a maioria delas cimentei depois de um trabalho exaustivo para a faculdade acerca do aborto em Portugal.
Mas não tenho de citar mais nenhuma, apenas esta: o cidadão só existe depois de nascer, nunca enquanto tem 5, 6, ou 7 semanas. Logo, LEGALMENTE, ele não pode ser assassinado. O que significa, portanto, que há mulheres em Portugal a ser PRESAS por matar um cidadão que não existe.
É taõ simples quanto isto: a lei é inconstitucional.

P.S. : devo recordar os mais esquecidos, como o César das Neves, que quando a lei foi mudada em 1984 para permitir os 3 casos de aborto legal (eugénico, terapêutico e ético) o escabeche foi tal que quase se penduraram os "pró" pelo pescoço em praça pública.
A dita lei veio substituir uma disposição legal que era vigente desde... 1850.
Do I make myself clear?

Cumprimentos a todos.
Afonso, a ver se o teu Porto ainda limpa o sebo ao Benfica.

6:36 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ao ou à Gia,

decididamente o trabalho que fez para a faculdade não deve ter tido um âmbito jurídico. Porque de direito percebe muito pouco.
Sabe é que o homicídio implica um atentado contra a pessoa humana, não contra a pessoa jurídica, não contra o cidadão. Sabe, por exemplo, que há pessoas juridicamente falando que nada têm de humano? Falo das sociedades, da fundações, das associações. Se alguém aniquilar uma sociedade, não comete um homicídio, pois não?
Então, instrua-se melhor. Pense melhor. E só depois insulte o João César das Neves. Até porque com a sua argumentação tola em nada conseguiu desmontar o brilhante texto de uma pessoa que se limita a expor a falta de honestidade democrática dos políticos e parlamentares que defendem o sim.
Ana

11:37 da tarde  
Blogger Afonso Vaz Pinto said...

Antes de mais gostaria de dizer que concordo absolutamente com João César das Neves na questão central do seu artigo: tem havido, de facto, graves ofensas à democracia nesta questão particular do aborto.
Para além da discutível convocação de novo referendo, têm sido constantes as jogadas forçadas com o objectivo único de fazer valer a sua vontade sobre os outros (a do sim sobre o não, leia-se). Muitos acharão normal. Dirão que é disso mesmo que se trata e que será assim que se “luta” em democracia. Pois eu, como democrata, bato com o pé e digo que não. Democracia é um bocado mais abrangente do que isso. Neste caso do aborto e em particular do referendo, trata-se de averiguar o que a comunidade (os cidadãos portugueses) quer fazer neste assunto. Ora para o sim ou para o não, o que se quer saber quando se convoca um referendo, é apurar o que a comunidade quer, e não realizá-lo, marcá-lo, organizá-lo, única e exclusivamente, para «ganhá-lo», como dizia o nosso primeiro-ministro, José Sócrates.
Não se fazem omeletas sem ovos, assim como não existe democracia sem os incontornáveis democratas. Elementar? Em Portugal não. O próprio primeiro-ministro do país é o primeiro a dizer, comentando a data da «consulta aos portugueses», que este referendo é para «ganhar». Portugal é mesmo assim: um cruzamento de culturas fantástico que no reverso da medalha mostra estas cicatrizes e tiques de terceiro mundo, onde reina o caos e a democracia é promessa eleitoral.
Quanto ao “tutano” da questão, sou frontalmente contra o aborto, como é sabido. Contudo, acho que – e eu dar-lhe com a democracia – é pouco útil olhar para a questão com a já habitual forma redutora de ver as coisas: nós, os bons; eles, os maus.
Acho que dois dedos de testa bastam para olhar esta questão de outra forma. E não estou sequer a falar de consensos, nem de negociações, mas penso que seria útil olhar para o outro lado da barricada e tentar não ver vândalos com pinças nas mãos para matar todos o fetos do mundo.
Agora uma coisa digo, sou totalmente contra o homicídio de seres humanos que não têm escolha, por outros seres humanos que escolhem apagar as acções que escolheram para si. Trocado por miúdos: sou totalmente contra o aborto e chego a preferir centrar-me nas três formas legais de aborto existentes em portugal. Porque sou humano tenho dúvidas, muitas dúvidas.
Hei-de voltar, mais tarde, a este assunto.
Abraços.

10:48 da manhã  
Blogger Gia said...

Cara Ana,

O seu tom agressivo é típico dos anti-despenalização, muitas vezes mesclado de arrogância, outras vezes não (é o caso do Afonso, com quem já discuti o assunto em plena "harmonia").
O meu trabalho para a cadeira de Métodos Quantitativos não tinha qualquer âmbito jurídico, sim social, e foi neste âmbito que eu mudei a minha postura quanto à condenação de mulheres.
Se a Ana tem conhecimento de causa e o homicídio refere-se à pessoa humana e não jurídica, então não tenho qualquer oposição a esse facto. Só preciso que me elucide: a pessoa humana começa exactamente quando?
Se é no momento da concepção, então o Estado apoia três tipos de homicídios? Se é a partir das 12 semanas, isso significa que antes trata-se apenas de uma massa? Explique-me isso por favor(nem precisa descer do seu pedestal).
A verdade é que o que se condena na mulher não é ela matar, sim as razões que a levam a fazê-lo. Se matar o bebé por este ser deficiente, trata-se de um acto de prevenção porque a sociedade não quer cá "def". Se matar o bebé porque foi violada, então assassina um ser saudável mas que foi concebido sem o seu consentimento.
Ora isto defende a protecção da vida e da pessoa humana, ou apenas sanciona (ou condena) os motivos da mulher?
Os partidários do NÃO em todas as situações são mais coerentes que os do NIN. Mas os do NÃO também se esquecem que existe o aborto destinado a salvar a mãe porque ela corre perigo de vida se levar para a frente a gravidez. Devem morrer ambos?
Afinal, em que se fundamenta o NÃO à despenalização? Na vida, em alguma vida, ou naquilo que a sociedade arrogantemente acha que deve ser a conduta da mulher?
Quando lhe passar a azia faça o favor de me elucidar.
Melhores cumprimentos

(Gia é nome de mulher. A primeira modelo a morrer publicamente de SIDA foi Gia Carangi, em 1986).

2:55 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Gia,
não estou com azia. Apenas me faz confusão que pessoas com uma ideia destorcida tentem argumentar juridicamente quando não percebem nada da matéria em causa. A vida humana começa no momento da concepção. É por isso que os Tribunais Portugueses conferem um direito à indemnização ao feto (e não apenas à mãe) quando afectado na sua integridade física ou morto antes do nascimento.
Refere-se, entretanto, às três situações em que o aborto não é considerado crime. Ainda que pessoalmente não concorde com todas as excepções, elas não implicam qualquer falta de unidade interna no sistema jurídico. Pelo simples facto de o nosso legislador ter entendido que naquelas situações não é exigível à mãe outro comportamento (e assim se considera excluída a culpa) ou porque se valoram bens jurídicos em situações muito específicas (e assim se excluí a ilicitude). Sabe... se a Gia (já percebi que é mulher) matar uma pessoa comete um crime. Se matar uma pessoa para se defender de uma ameaça de morte actua em legítima defesa, não há crime e não é punida. A lógica é a mesma. Get it?

9:01 da tarde  
Blogger DM em Caracas said...

Cara Gia,
Estamos aqui a falar de dois tipos penais diferentes: o homicídio e o aborto.
O 1.º refere-se às pessoas já nascidas e o 2.ª a pessoas ainda não nascidas, pelo que não se deve confundir um com o outro.
Apesar de não ter personalidade jurídica completa, um feto tem direitos desde a concepção. Eu posso fazer um testamento a favor de um feto, por exemplo e se eu morrer antes do nascimento dele, ele sucede-me ainda sem ter nascido.
Os verdadeiros problemas com que o Estado se devia debater não era legalizar o aborto, mas sim fazer com que este deixe de ser a última opção porque alguém não estava bem informado antes de ter relações sexuais ou porque alguém não tem condições económicas e sociais para sustentar um filho.

4:06 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

intiresno muito, obrigado

10:35 da manhã  

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